O poeta quer, a palavra
significa. Não obstante, quando algemado pela forma, o conteúdo erradica por
ficar preso, enclausurado, na métrica e na rima que a tantos “amigos das
letras” estima. Ora quem forma, terá necessariamente que esquecer norma e ser,
pois, eterno e insaciável peregrino das palavras, tornando-as ricas, com
significado, sem que o pensamento fique a nado. A natureza e a vida são pura
poesia, mas quando a queremos por imposição arrumada no papel, deturpando a
realidade, a poesia rima somente com melodia, muitas vezes vazia. Deste modo,
traído pela algema da forma, torna-se pesada e inútil a criação, sem permitir a
devida fruição.
O escritor que efetivamente o
é renasce constantemente da morte e do fracasso, enfrentando-se sem mais
receios ao ser pássaro fugido dessa e de tantas outras gaiolas, recebendo do
vento o alento. Livre, dará mundos ao mundo, lutando por seus anseios, cruzando
os céus altos, sem sobressaltos, onde se consola e consolará os que o rodeiam.
Fará ainda pinceladas de cor, amores à sorte, levantará marés e tocará as
estrelas, roubando centelhas ao fogo dos céus, vivendo, pelos menos aquando do momento
da criação artística, o silêncio das palavras sem o peso que esmaga.
Na dimensão holística do ser
que o é quando a si se significa, o escritor beija a dor, açucarando e
sobressaltando a inquietude humana. É, pois, cocktail de melancolia q.b. e alegria
q.b. na dor escrita, lida e vivida que desafia a imortalidade. Já a mente que
mente a si mesma, ao viver confinada a pequenos mundos, não se permite abrir
aos mares alheios revoltos, irados, permanecendo no recato salutar do lar, do
baloiço da sua alma, que chia e se desgasta com os anos cinzentos. Ainda
importante, o retornar constante ao passado coloca a nu o perigo de ficar
aprisionado como sendo um frustrado falhado ou sábio presunçoso, portador de
chaves de fechaduras jamais existentes para flagelos e emoções cujo semblante
está deturpado e cujos anos ajudaram a desfigurar ou mesmo a sumir em
definitivo. Para além disso, a demanda incessante pelo perfecionismo e por
pertencer ao rebanho nas ideias e opiniões impele a inércia da mente,
tornando-o marionete dos tempos, clone de uma sociedade gasta, fútil. Por
último, os que se apelidam de realistas, afagando as suas incertezas, nada mais
serão do que sonhadores que embebidos dos seus receios se perderam no trilho da
vida. Impera, pois, que, de pés assentes no presente, se desprenda do
pedantismo e do pedestal, sendo mais humanista e humanitário do que humano e
verdadeiro para consigo e para quem o lê, recorrendo à escrita quando deveras
perceciona que só a ela tem naquele momento como fonte que sacia o âmago.
Por outro lado, mas em
perfeita sintonia, a pintura na sua conceção artística abraça vivências
surreais, pessoais ou coletivas e permitirá colher e coligir o perfume que
exala da flor do momento que quer ver-se viva no papel, na tela, numa parede
que separe mundos, unificando-os. Por ao seu redor gravitarem emoções e
sobressaltos, no sentido de se reencontrar, expressa o que sente, por linhas
que se unem harmoniosas no papel e cores, na esperança alva de permitir o
cruzamento dos mundos em que participa. Assim, por relevar a subjetividade seja
na sua perceção como seja na sua conceção, será reflexo do fluir unidirecional
nas veias artísticas do sujeito, que fará uso da imensurável teia de cores,
texturas e contrastes de que dispõe. É, deste modo, que percorre traços de
realidade ou de índole onírica, abraçando-os na plenitude do ímpeto emocional
que se gera e contagia, dando, finalmente, nova cor ao quotidiano, preenchendo
o vazio da vida, representado pela tela em branco.
Luís Bernardo Fernandes, 4º
ano
0 Comentários