57ª Edição da aNEMia

Caros leitores,

Em tempos conturbados de doença, dor e medo, em que a natureza comunitária e da vida em sociedade que tanto caracteriza o Homem nos é um pouco roubada, resta-nos fazer o melhor que podemos com os meios tecnológicos que temos ao nosso dispor – nunca pensámos que tão cedo chegaria o dia em que uma SMS equivale a um sorriso ou um GIF equivale a um abraço.
Também neste momento de distanciamento e isolamento social damos por nós com horas a mais para ocupar, livros insuficientes para ler e muito poucos filmes ainda por ver. Vemo-nos entediados… Logo nós, que estamos sempre à procura de experiências, aventuras – ou, se não é o caso, pelo menos procuramos incessantemente manter uma rotina que nos preencha.
Embora não possamos dar-te a nova edição da revista aNEMia em mão, para que possas folhear e partilhar com os teus amigos, não podíamos deixar de fazer chegar até a ti a 57ª edição da aNEMia, desta vez completamente rendida ao formato online. Ainda que concordemos que não é o seu formato ideal (há melhor do que o cheiro do papel acabado de imprimir ou que a sensação de abrir uma revista/livro pela primeira vez?), nada neste momento da nossa História é ideal. Por isso, devemos colher os frutos daquilo que temos em mãos e, por isso, convidamos-vos a aceder à versão digital da nova aNEMia, agora disponível no issu do NEM/AAC (icone do meio do lado direito na versão desktop).
A 57ª edição da aNEMia é, parece-nos, a mais heterogénea. Trazemos-vos um caleidoscópio de pensamentos, temas distintos e muitos sentimentos. No mundo caótico em que vivemos atualmente, escolhemos um conjunto de temas que por vezes assustam, chocam e intimidam. A desinformação é o pior inimigo da mente que fala e esperamos contribuir para que possam viver de olhos abertos para as questões mais importantes do dia a dia ou, pelo menos, do nosso enquanto estudantes. Conheçam os órgãos que nos representam, as dores que nos são comuns e as novidades que nos ameaçam.
Tudo isto sem esquecer a contribuição especial da revista mRNA, do curso de Bioquímica, a quem nos aliámos para tornar ambos os projetos ainda mais aliciantes! Lembrem-se sempre que é fora do nosso conforto que as coisas extraordinárias acontecem!
Infelizmente, a situação vivida atualmente com a pandemia e a necessidade de distanciamento levaram ao cancelamento inevitável do nosso evento de lançamento, que pensámos para vós com tanto carinho. Lamentamos essa situação, comprometendo-nos a colmatar esse vazio com mais novidades que preencherão o vosso tempo de formas diferentes!
Lembrem-se! As portas da nossa casa estão abertas para vos receber. Sempre que quiserem fazer parte deste projeto, enviem e-mail para anemia@nemaac.net, anónimo ou não, pois teremos todo o gosto em partilhá-lo com vocês. Obrigada por nos lerem, por nos procurarem e por nos ajudarem a dar um salto neste projeto. O progresso, mesmo que seja pequeno, é sempre um passo para a frente no caminho até aos nossos sonhos.
Fiquem em segurança!

A Coordenadora da aNEMia, Sara Cardoso, 4ºano
O Editor Assistente, Filipe Barbosa, 4º ano

Saúde Mental

Hoje venho falar-vos de saúde mental. Imaginem-se num Mundo paralelo a este, não tão paralelo como queríamos porque inevitavelmente para lá caminhamos, onde a saúde mental de cada um de nós estaria a ser levada por caminhos apertados. Imaginem-se em situações desconfortáveis para vocês, para os vossos corpos e corações e aniquilem a necessidade de se sentirem bem com isso, ficando, assim, a vossa sanidade mental na primeira linha de combate. E querendo eu trazer-vos motivos para acreditar que conseguimos tudo aquilo que quisermos e ultrapassaremos este momento de maior dificuldade mundial – na saúde pública, na economia, na política, na gestão de países, na rutura de stocks - assusta-me que se fale (porque se fala, se olharmos com olhos de ver) na prioridade na saúde mental.
Em todo o Mundo existem, neste momento, milhares de pessoas fechadas nas suas casas e, aqueles que não se encontram com as portas trancadas à pandemia, encontram-se fechados em si: profissionais de saúde e profissionais na linha da frente no que toca à necessidade de bens essenciais. Essencial é, também, olhar para isto e parar para pensar. Pensar no impacto gigante que este processo trará às nossas vidas, num futuro que ainda não sabemos quando chegará. Não sabemos para onde caminhamos, mas caminhamos juntos. Importa olharmos para as nossas rotinas que agora deverão ser sobrevalorizadas, redefinir objetivos e mantermo-nos conscientes, mas em equilíbrio, como uma corda bamba entre a preocupação e a satisfação de estarmos aqui.
Ninguém pode sair para tomar o café da manhã na esplanada, ouvir a peça de teatro que dá as boas vindas ao fim de semana, passar à frente na fila do supermercado porque estava demasiado grande para a nossa pequenez e os segundos contados da nossa agenda levam-nos a pedir permissão para passar à frente.
O mundo foi chamado a abrandar e, individualmente, cada de um de nós teve de parar ou teve de acelerar na luta contra a exponencialidade da curva epidemiológica. O fim que queremos é o mesmo, nisto a humanidade está de mãos dadas. Foi preciso algo invisível e poderoso para nos fazer dar as mãos, ironia do destino ou não, sem nos podermos tocar.
E falando daquilo que me preocupa para além de tudo aquilo que nos preocupa: quero falar-vos de saúde mental.
Mantenham hábitos de vida saudável: criem um ritmo de sono adequado às vossas necessidades, saiam da cama como se fossem sair de casa (e saiam do conforto do pijama), alimentem-se bem, sem exageros mas com espaço para aquecer o coração, pratiquem exercício físico, mesmo que o sofá e a vossa inércia queira falar mais alto, ouçam aquilo que vos faz feliz a cada dia e recordem-se disso todos os dias quando acordarem, leiam, mas, acima de tudo, escrevam. Escrever consciencializa-nos. Permitam-se. Não se descuidem, não deixem de olhar pela janela e ver a coisa pelo lado bom. Mantenham a casa limpa e o cabeça no sítio, atualizem-se com informações fidedignas e apenas durante o tempo necessário para não gerar em nós (ainda mais) ansiedade.
Preocupa-me o impacto da pandemia na saúde mental. Preocupa-me que quando possamos sair à rua e nos socorrermos à liberdade, de livres pouco teremos. Preocupa-me os profissionais que depois da guerra, terão pós-traumas importantes e que necessitarão de ajuda para serem ultrapassados. Preocupa-me que não procurem ajuda. Preocupa-me as populações, desde os mais novos aos mais velhos. Temos que tomar medidas individuais que nos permitam sermos melhores e continuar a alcançar objetivos e metas que antes nos pareciam insignificantes.
É urgente cuidarmos uns dos outros, mas é urgente que cuidemos de nós.
E, no meio da incerteza e da imprevisibilidade do destino, não se esqueçam de acreditar. Não se esqueçam de ser pacientes, compreensivos e amigos deste que é o único planeta que temos para estar. Encontrem-se. Acreditem. Vamos sair. Vamos voltar a sair e nada vai ser como antes, o que não será necessariamente mau, porque temos em nós as ferramentas necessárias para nos adaptarmos à mudança desde que nascemos.
Cuidem de vocês e cuidem da vossa saúde mental, porque sem ela, aí sim, estaremos perante outra crise mundial.
Eu acredito! E tu, acreditas?
Francisca Pinho, 5º ano

O Civismo no Egocentrismo de uma Sociedade Individualista

Enceto esta reflexão, referindo que todos somos agentes de saúde pública e que, no pugnar da presente pandemia, se revela impreterível o civismo, que preconiza o respeito pelo outro.
Nas palavras de José Saramago, “o egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de generosidade as pequenas cobardias do quotidiano, tudo isto contribui para essa perniciosa forma de cegueira mental que consiste em estar no mundo e não ver o mundo, ou só ver dele o que, em cada momento, for suscetível de servir os nossos interesses”. Daí que, me indigne que haja prevaricadores que se esquivem das medidas de contingência ao frequentar, desnecessariamente, espaços públicos movimentados, sendo relevante sublinhar que quarentena não é sinónimo de férias e que a recusa deste regime quando obrigatório em confinamento profilático pode constituir difusão voluntária de doenças, punível pelo código penal.
A verdade é que a infeção por SARS-CoV-2 é inócua para uma grande parte das faixas etárias quando saudáveis, com quadros benignos ou subclínicos. Não obstante, emerge a necessidade de responsabilização social no sentido de proteger grupos de risco, a citar pessoas idosas, imunodeprimidas e com quadros oncológicos e de doenças crónicas respiratórias associadas na medida em que os recursos do SNS são limitados no que diz respeito a ventiladores e camas nos Cuidados Intensivos, passando o intuito destas medidas de contingência por aplanar a curva de infeção, evitando picos de infetados num curto período temporal e assim o colapso dos sistemas de saúde. Perceba-se que o SNS tem lacunas face ao desinvestimento gradual e que, caso não se tomem medidas de prevenção e não reativas, se pode assistir a um cenário de calamidade como nunca antes visto em décadas.
Já no que concerne aos mecanismos biológicos da doença, sabe-se que o vírus SARS-CoV-2 se blinda ao recetor ECA2, o que tem inerentes implicações terapêuticas. Sabe-se ainda que estes recetores abundam no aparelho respiratório inferior e que, por cada década de vida, o seu número aumenta 20%, o que pode explicar a maior vulnerabilidade dos mais idosos. Sabe-se também que é altamente contagioso e manifesta-se assintomático na vasta maioria das crianças, o que pode ser preocupante pela disseminação “silenciosa” do vírus.
Entenda-se para os mais distraídos que a mortalidade por gripe sazonal não atinge os 0,1%, situando-se a taxa de letalidade do vírus SARS-CoV-2 entre 2% a 4%, sendo que para tal discrepância se deve essencialmente a inexistência da denominada imunização cruzada, que se adquire de um inverno para o seguinte e que confere alguma defesa ao vírus mesmo que mude, e naturalmente de vacina.
Assim, reitero a necessidade impreterível de se evitar o contacto social próximo e aglomerações, de manter uma higiene vigilante, lavando as mãos como sendo a medida mais profícua e também afastando as mãos da boca, nariz e olhos. E, acima de tudo, fiquem em casa, saindo só o estritamente necessário.
Ainda importante, denoto clara preocupação com a irracionalidade gerada pelo alarmismo desproporcionado que conduz as pessoas a irromper pelas farmácias e supermercados, comprando desmedidamente soluções desinfetantes, máscaras – que são exclusivas para grupos de risco-, papel higiénico e bens alimentares.
Finalmente, no papel de estudante da área médica, apelo veementemente a que todos sejamos meios condutores de exemplos, respeitando as normas e procedimentos da DGS, deixando um agradecimento a todos os profissionais de saúde pelo trabalho titânico e incansável na salvaguarda dos seus doentes, mesmo podendo também contrair a doença.
Em suma, termino enfatizando que a tempestade irá passar se estivermos todos no mesmo barco, mesmo em águas agitadas e ainda vastamente desconhecidas, e se cada um de nós cultivar o altruísmo e o civismo, mesmo no egocentrismo de uma sociedade individualista.

Luís Bernardo Damasceno Fernandes, 3º ano