1001 Especialidades: Manual do Estudante Indeciso #12 – Pedopsiquiatria

O que significa ser médico desta especialidade? Quais são as principais frentes de ação?

Significa acompanhar crianças e adolescentes em todo o seu desenvolvimento, nos vários domínios, incluindo o desenvolvimento cognitivo, afectivo e psicomotor. Significa trabalhar em rede, com os jovens, a família, escola e técnicos que trabalhem com eles. As frentes de acção são variadas e dependem da patologia mental específica e da idade dos jovens. Trata-se de uma especialidade abrangente, cuja acção principal é na consulta externa, mas que se estende ao serviço de urgência, internamento e hospital de dia. É ainda uma especialidade ecléctica, no sentido em que exige um domínio das técnicas de psicoterapia verbal, das intervenções farmacológicas e das neurociências.
 
Em que momento do seu percurso académico decidiu que tinha interesse em seguir esta especialidade?
Já escolhi o curso de Medicina pelo interesse na saúde e doença mental. A opção pela infância e adolescência deu-se pelo meu interesse no desenvolvimento, tendo tomado a opção final durante o Ano Comum.
 
Quais as principais razões para ter tomado esta escolha? O que mais procurava e entusiasmava nesta decisão?
Poder escolher uma especialidade muito ecléctica, que permite trabalhar em muitos contextos diferentes e na qual o cruzamento entre diversos saberes é fundamental. Mais ainda, escolhi-a por ter a possibilidade de fazer a diferença numa faixa etária em que a perspectiva de mudança é maior.
 
Quais são os principais locais/serviços onde acontece o seu trabalho diário?
O grosso do trabalho é feito em consulta externa. Os serviços podem dividir-se por faixas etárias, nomeadamente: Primeira Infância; Idade Escolar e Adolescência. Existem, mais ainda, unidades para problemas específicos, como as Perturbações do Comportamento Alimentar e a Pedopsiquiatria de Ligação (em que há um contacto estreito com as outras especialidades médicas). Por fim, podemos trabalhar no serviço de urgência, no internamento (de adolescentes) e Hospital de Dia.
 
Como descreveria o ambiente entre médicos internos/médicos especialistas/enfermeiros/doentes nos serviços por onde passa? Como é a entreajuda entre os médicos mais e menos experientes?
Há um bom ambiente entre os técnicos.
 
Considera que existe idoneidade na maior parte das valências pelas quais passa? Como é a qualidade de ensino?
Sim. Nos serviços onde não exista idoneidade para todas as valências requeridas, há a possibilidade de as realizar noutro hospital com essa idoneidade. Relativamente à qualidade do ensino, é boa.
 
Existe, no seu trabalho, a possibilidade de realizar estágios complementares (estrangeiro, formação complementada noutro centro, …)?
Sim, existindo abertura para que o façamos.
 
Como descreveria um dia de trabalho nesta especialidade? Como caracteriza o nível de esforço e de dedicação a que é sujeito diariamente, na sua profissão?
 
O dia de trabalho depende do tipo de serviço a que se está alocado, dependendo também dos serviços que são oferecidos pela especialidade em cada hospital. Já o esforço e dedicação dependem do brio com que cada profissional se dedica, contudo, diria que é permitido um bom balanço entre o trabalho e a vida pessoal.
 
Considera que esta especialidade é capaz de dar uma boa abertura para a existência de hobbies? E relativamente à vida pessoal/familiar?
Claramente! A ambas as questões.
 
Relativamente à carga horária, como considera ser a sua carga de trabalho e como descreve as restantes obrigações (horas de trabalho extra, bancos, …)? Ainda nesta questão, o que varia, ao longo dos anos de internato?
Não se trata de uma especialidade em que os internos sejam submetidos à exigência de fazer trabalho nocturno ou muitas horas extra nos serviços de urgência. Geralmente, para casa, leva-se o estudo e o trabalho académico.
 
Como interno, como é/foi o seu grau de independência nas técnicas e abordagem para com os doentes?
Bastante elevada. Naturalmente que é um processo gradual, mas senti sempre que podia ter a minha abordagem, dentro da legis artis.
 
Quais as subespecialidades pelas quais se poderá optar? Existe liberdade total para esta escolha? Como acontece o processo?
Existem algumas divisões, possíveis por setting (internamento, ligação, hospital de dia) ou por patologia e grupo etário (perturbações do comportamento alimentar, primeira infância…). Não se tratam de subespecialidades formalmente reconhecidas. Dependerá da necessidade dos serviços para onde se irá trabalhar e da direcção que cada um der à sua formação individual.
 
Como acontecem os momentos de avaliação? Em que período do ano? Qual o grau de dedicação e maiores dificuldades?
São, maioritariamente, avaliações contínuas dos estágios que se frequenta, havendo um momento de avaliação para discussão do estágio. Neste caso, é vantajoso o facto de se premiar a dedicação clínica durante os estágios.
 
Qual diria ser a maior dificuldade que encontra nesta especialidade?
O facto de ser uma especialidade que abrange muitas áreas de conhecimento é um factor positivo, mas também pode levar a que nos sintamos um pouco perdidos no meio de tanta coisa diferente, mas importante, em que nos temos de debruçar. A maior dificuldade, pelo menos no início, é ser praticamente tudo novo, pois a especialidade é pouco (ou nada) abordada durante a faculdade.
 
Quais os principais fatores positivos na sua especialidade?
A interdisciplinaridade, o balanço entre trabalho e vida pessoal e podermos intervir e fazer a diferença naqueles que são os mais vulneráveis.
 
Como descreveria a sua especialidade em relação à possibilidade de:
Progressão de carreira – esta questão tem de ser integrada nas carreiras médicas e não tanto na especialidade.
Enveredar pela carreira investigacional – é possível fazer investigação, incluindo doutoramento. A principal dificuldade é obter um orientador Pedopsiquiatra, porque ainda há poucos doutorados na área.
Constante inovação científica – é uma especialidade em que a inovação científica é muito grande e que beneficia das descobertas de áreas anexas, como as neurociências e a psicologia.
Oportunidades de trabalho tanto no setor privado como público – boas, pois trata-se de uma especialidade com défice de especialistas.
 
Escolhia novamente esta especialidade? Está a corresponder às expectativas que tinha? Quais foram as principais surpresas?
Escolheria novamente a especialidade. Apesar de ter ponderado bastante a decisão e ter procurado informar-me, após ingressar na mesma, foi uma boa surpresa a abrangência da especialidade e as oportunidades de trabalhar em coisas tão diferentes.
 
Diria que é necessário mais talento/arte ou, por outro lado, estudo/dedicação para se prosseguir esta especialidade?
Ambas. É necessário dominar a técnica (avaliação e intervenção), mas ter a destreza de adaptar aos casos concretos. Os casos não têm um diagnóstico/problema único e é necessário adaptar o conhecimento das guidelines aos casos concretos. O que será mais talento, mas em que é possível trabalhar, é a capacidade de ser empático com os jovens e famílias, pois nesta especialidade a relação terapêutica é, efectivamente, uma arma terapêutica.

Texto redigido com a ajuda do Dr. Pedro Santos, Pedopsiquiatra
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