Segunda
feira, 18 de novembro, pelas 19h, decorreu um movimento em massa dos estudantes
de Medicina com repercussão a nível nacional – Porto, Coimbra e Lisboa – do
qual constou a assinatura de uma carta com propostas de resolução dos problemas
que os estudantes de medicina estão a atravessar, o que se vê repercutido numa
própria inviabilidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Este
movimento apoiou sobretudo os colegas que prestavam exame, e reivindicou
direitos pelos próximos.
O
objetivo das cartas passou por chegar ao Ministério da saúde e Ministério da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior, pela mão da Associação Nacional de Estudantes de
Medicina (ANEM), já que sendo registadas, existe a obrigatoriedade de resposta.
Em
Coimbra, Trouxemil, houve a oportunidade de entrevistar a Vice-presidente da
Associação Nacional de Estudantes de Medicina (ANEM), Carolina Caminata; a presidente
do Núcleo de Estudantes de Medicina da Associação Académica de Coimbra (NEM/AAC),
Catarina Dourado; o Presidente do Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade
da beira Interior, Francisco Capinha; e os Mestres em Medicina e prestadores de
Prova Nacional de Acesso à Especialidade, Dra. Cátia Sólis e Dr. Pedro Silva.
Catarina Dourado, quais são as principais críticas tecidas
pelos estudantes, que os moveu a realizar o movimento?
Existe
um problema no panorama nacional que temos enfrentado nos últimos anos e que a
ANEM tem debatido afincadamente. Os estudantes não sabem o número exato de
médicos que exercem medicina, tanto a nível público como privado e setor social;
não sabem as exatas necessidades médicas da população a nível de especialidades,
ou distribuição por região. Neste sentido vem a proposta da ANEM, depois de
várias petições apresentadas em Assembleia da República com soluções para este
problema, mas que têm vindo a ser constantemente ignoradas. Assim, vimos neste esforço
conjunto com os candidatos que realizam a prova e os estudantes que se deslocam
às caves de Coimbra, para que cheguem aos referidos Ministérios e possa ser feita
alguma coisa.
Acrescento
que não temos uma avaliação das necessidades do País que adeque as necessidades
formativas pós-graduadas em termos de especialização médica e distribuição
geográfica pelas regiões mais deficitárias dessas mesmas especialidades, para
que depois também possam ser adequadas ao número de vagas, ao numerus clausus
no curso de Mestrado Integrado em Medicina, para que a longo prazo haja um planeamento
integrado dos recursos em Saúde.
Francisco Capinha, quais as propostas que considera mais
relevantemente mencionadas na carta para solucionar o problema identificado?
A
carta propõe um observatório para o planeamento de recursos humanos em saúde,
que vem em Diário da República, e o objetivo passa por ter uma estrutura que congregue
não só a Tutela, mas também a Ordem dos Médicos, o Conselho de Escolas Médicas
Portuguesas, o próprio Conselhos de Reitores da Universidade Portuguesa, servindo
para aferir quais são as necessidades de recursos humanos em saúde em Portugal,
e que permita estabelecer um planeamento estratégico do SNS a médio e longo
prazo, e não só com medidas rápidas. É necessário que haja uma estrutura que consiga
fazer o planeamento para sabermos onde temos de atuar, integrando e articulando
aquilo que são necessidades do pós-graduados, profissionais de saúde efetivamente
no ativo; e aquilo que são as necessidades de formação, isto é, no pré- graduado,
quantos estudantes precisamos de formar e para que especialidades, o que precisamos dos profissionais de saúde para
termos um sistema eficiente e funcional.
Francisco, enquanto estudante da Universidade da beira
Interior, hoje tiveste que te deslocar a Coimbra porque neste momento nem todas
as cidades sede de escolas médicas têm possibilidade de realização de prova.
Sim,
é o meu caso particular, que venho da Beira Interior, mas esta também é uma
realidade da Universidade do Minho e da Universidade do Algarve, sendo que esta
última nunca teve possibilidade de realização de prova e quer lutar para a ter,
pois é uma grande limitação. No fundo os nossos estudantes estão dispersos pelo
país, com custos acrescidos de deslocação e estadia, pontos muitos negativos
que esperamos alterados num próximo ano. Questão que se pretende ver revertida
para Braga e Covilhã, estendida para o Algarve.
Carolina Caminata, que resposta é espera da parte da
Tutela?
A
ANEM está a conversar com estes Ministérios há vários meses e nunca se passou
da fase de conversação. Nunca se chegou à finalização e a uma proposta que realmente
satisfizesse as necessidades do SNS de momento. O que esperamos é realmente a
concretização da proposta para planeamento dos recursos de saúde em Portugal,
no Diário da República, achamos ser uma necessidade grande deste momento.
Acrescento
que a chave da resolução do problema também passa por juntar estes dois
ministérios, que estão tão envolvidos na formação dos estudantes de Medicina em
Portugal, que comecem a reunir para planear os recursos humanos em Portugal.
Interpelados os prestadores da Prova Nacional de Acesso à
Especialidade, a nova prova correspondeu às expectativas criadas e deu reposta
os flagelos identificados à anterior? O que achou da iniciativa do movimento
das cartas?
Dra. Cátia Sólis: Em relação à Prova Piloto, o exame foi muito mais difícil
e o tempo insuficiente para o seu término, havendo perguntas com a extensão de
uma página ao integrarem análises laboratoriais e muito texto, muito também
desnecessário e inútil para a resposta à questão. Em relação aprova anterior
existe maior justiça, uma vez que pode ser questionada qualquer coisa, dada a
amplitude da matriz e, portanto, não há forma das perguntas se repetirem
constantemente. Há um maior apelo ao raciocínio clínico do que à memória.
Quanto
ao movimento, gostei da ideia porque transpareceu o interesse e preocupação de
todos para com o futuro. A Medicina está a “afundar” e quando entrámos no curso
tal não se previa. O que parecia estável tornou-se uma incógnita. Há cada vez
mais médicos não especializados e isso assusta. Sinceramente quando me perguntam
se vale a pena entrar no Curso de Medicina, aconselho a ponderarem bem essa
escolha.
Dr. Pedro Silva: Esta prova constitui uma maior aproximação àquilo que é a prática
clínica, relativamente à anterior. No entanto, há certos pontos a ajustar: os enunciados
por vezes demasiado longos não incentivam ao raciocínio clínico, mas sim à memorização,
pelo que quase não há tempo nenhum para pensar. Acho positivo a ANEM levar as
nossas reivindicações aos Ministérios, porém, acho que a situação não se vai
alterar, devido às restrições impostas pelo Executivo.
A
cobertura do evento terminou com a convicção de que, por mais incerto que seja
o futuro da formação Médica em Portugal, os estudantes estão unidos numa luta perseverante
e resistente pela qualidade da formação médica e, acima de tudo, pela melhor
qualidade de prestação de serviço aos utentes.
Sara Meirinhos, 5º ano