As canetas deslizam sobre o
papel branco que contrasta com o céu lá fora. O dia está
a terminar com a folha rasurada e à espera de
ser completada como pele cravada de tatuagens.
A
palestra decorria numa sala carregada de recordações das aulas de medicina. Eu estava
rodeado de pessoas fazendo relembrar alguns episódios até talvez marcantes na
minha vida. A sala tinha a mente carregada.
Pequena e interessada, a
rapariga ávida de curiosidade estava muito concentrada e compenetrada no
discurso da palestrante. Percebia-se o entusiasmo incorporado por ela na
sessão. Ela tinha vindo de propósito de Lisboa.
Eu sentia-me observada e
fragmentada por um rapaz com aspeto descuidado. Queria desaparecer, fugir,
destruir tudo à minha volta para que ele não me perseguisse. Repulsa é a
palavra que sinto neste momento. Continuo a escrever condicionada por uma mão
forte que se chama medo.
A sessão caminha a passos
largos do fim, o desconforto da rapariga parece que está a desvanecer-se. O
rapaz tirou os olhos dela e começou a escrever, a escrever, … tanto que a folha
se encontrava totalmente cravejada de palavras. Finalmente o texto ganhava
corpo.
O fim chegou. Cada um foi-se
embora para as suas vidas, para o seu núcleo, sem mais se cruzarem: o rapaz e a
rapariga. É o tempo que continua a andar até que estes fetos atinjam o final do
tempo de gestação da vida.
Pedro Silva, escrito no Workshop de Escrita Criativa
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